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A área de Recursos Humanos (RH) das companhias tem papel fundamental na construção de uma mentalidade mais sustentável. Durante o II Fórum da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-Brasil) de Sustentabilidade, Theunis Marinho, presidente da Associação explicou que é “o profissional de recursos humanos tem que ser protagonista disso. Ele não deve apenas apoiar, mas repensar os processos e práticas”.
Segundo Marinho, é essencial que se considere os colaboradores nesse processo, afinal, sem eles haveria um desequilíbrio no tripé da sustentabilidade, que é composto pela tríade Pessoas, Planeta e Resultado Financeiro. Diante desse cenário, a área de Recursos Humanos é fundamental, pois tem a capacidade de envolver todos os departamentos nesse processo, estimulando mudanças criativas e inovadoras com foco em negócios mais responsáveis e no bem-estar da comunidade e do planeta.
Avanços em sustentabilidade: liderança e governança
O professor e gerente do Núcleo de Sustentabilidade da Fundação Dom Cabral (FDC), Heiko Hosomi Spitzeck, falou sobre a relação entre sustentabilidade e liderança. Segundo Spitzeck, diversas pesquisas da FDC apontam a interdependência entre os dois assuntos e, para ele, sustentabilidade é um tema que nunca pode ser discutido de forma isolada, mas sempre atrelado a algo, seja na estratégia de negócios, marketing, entre outros. “Nesse contexto, o RH é fundamental, mas ainda tem um longo caminho pela frente”, conta.
No ano passado, a Fundação Dom Cabral realizou uma pesquisa com 181 organizações do País, envolvendo 476 correspondentes. O objetivo era entender a visão do setor privado sobre a relevância atual e futura de questões sociais e ambientais para o negócio das empresas brasileiras. O resultado constatou que 83,14% dos participantes já reconhecem uma relação direta entre sustentabilidade e lucratividade.
A percepção das lideranças sobre a importância desses temas tem o poder de promover o desenvolvimento de práticas mais responsáveis e até antecipar realidades que, no futuro, podem ser prejudiciais para o ganho financeiro. Como modelo nesse cenário, o professor citou a BASF, empresa alemã global do segmento químico. “A empresa investiu, em 2002, 12 anos antes da crise hídrica chegar aqui em São Paulo, em eficiência aquática”, conta. Com isso, a BASF manteve sua produção inalterada e até desenvolveu produtos para outras empresas do setor.
“Com base nessa experiência, estamos rodando uma pesquisa para entender como uma conversa de sustentabilidade chega ao conselho de administração”, conta Spitzeck. Para ele, isso se dá reativamente, quando a bomba explode na sua mão, ou de forma proativa, como aconteceu na BASF, em que houve um investimento para evitar que a bomba explodisse lá na frente.
No entanto, o professor da FDC conta que os resultados parciais dessa pesquisa não são muito animadores, já que demonstram uma negligência por parte das lideranças em relação a esse tema. Para ele, o indicador da pesquisa relacionado à antecipação de potenciais passivos ambientais e sociais do futuro é o que mais preocupa. “O gap entre o cenário ideal e o cenário atual nesse quesito é de quase 60%. Ou seja, 80% dos conselheiros acreditam que deveriam antecipar os problemas, mas apenas 20% está de fato antecipando”, conta. Outro ponto que não corresponde ao cenário ideal é a bonificação dos executivos atrelada a indicadores socioambientais. “Menos que 10%, atualmente, faz isso”, explica Spitzeck, salientando que o RH deve ter ação ativa na implementação dessa prática.
Liderança sustentável além do líder
Heiko Spitzeck também chama a atenção para a necessidade de se criar uma cultura de liderança sustentável, que seja menos dependente de um único líder. “Eu vejo aqui no Brasil, tanto na esfera política quanto na esfera privada, uma grande dependência do líder. O que falta é uma reforma dentro das instituições. O ambiente externo está mudando e os novos anseios da comunidade serão importantes para você. Isso bate na estratégia, na cultural da organização e também na governança”, conta.
Para ele, essa mudança começa por uma nova liderança, com pensamento sustentável, que consiga conversar com vários stakeholders diferentes e inserir os anseios deles na estratégia corporativa, dando voz para eles no sistema de governança. “Aqui, o papel do RH é essencial, para contratar de acordo com a estratégia, selecionar pessoas, definir objetivos, o tipo de desenvolvimento que é preciso fazer, como trabalhar a retenção e o conhecimento e sucessão e promoção. Se um líder sustentável sai da organização, ela está preparada para encontrar alguém que vai continuar as gestões como os mesmos valores”, explica o professor.
Índice de sustentabilidade empresarial (ise)
Renato Moya, gestor de projetos no Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV-EAESP, o GVces, falou sobre o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da BM&FBovespa. Por meio de um questionário, desenvolvido e aplicado pela própria FGV, o índice avalia e estimula práticas sustentáveis, além de agregar valor às empresas que as colocam em prática.
O ISE é uma referência para a pauta da sustentabilidade e tem como objetivo “criar um ambiente de investimento compatível com as demandas de desenvolvimento sustentável da sociedade e estimular a responsabilidade ética das corporações”. Atualmente, 40 empresas participam do índice e juntas detêm 50% do valor de mercado negociado na bolsa. Segundo Moya, quem decide quem entra na carteira de investimentos do ISE é um conselho deliberativo presidido pela própria BM&FBovespa.
O palestrante mencionou a importância de práticas que, como o ISE, estimulem uma nova cultura sustentável. Segundo Moya, coincidentemente ou não, as empresas participantes do índice têm uma linha de desempenho maior no mercado que o restante das companhias, o que demonstram que transmitem mais valor e confiança. “O conjunto de empresas que se preocupa com sustentabilidade, em geral, ao longo tempo, tem performance melhor do que as que não se preocupam”, comenta.
Moya explica que quando uma empresa é convidada para participar do ISE, a decisão final fica por conta da diretoria, já que se adequar às exigências dessa carteira, como produção focada em responsabilidade ambiental e combate à corrupção, demanda muitos investimentos. Depois disso, é preciso que todas as áreas coorporativas sejam envolvidas na resposta do questionário, e aqui o RH tem papel essencial em engajamento e valorização da causa, estimulando a criação de uma nova cultura organizacional e da percepção de que a sustentabilidade socioambiental tem, sim, grande impacto nos negócios.